O Webinário Diversidade em Tempos de Crise teve a dinâmica de perguntas e respostas. A mediadora, Karina Pimenta, provocou os convidados Letícia Santana, Edson Cadette e Fernanda Neis.
Karina Pimenta: Por que é tão importante trazer a diversidade para nossas vidas?
Fernanda Neis: A missão do DeRose Method é transformar o mundo em um lugar melhor. Com esse grande sonho, os empreendedores não podem se restringir a transformar o mundo em um lugar melhor para algumas pessoas. Tal postura seria uma farsa. Há uma incoerência entre querer transformar o mundo e ser uma pessoa com a cabeça fechada e preconceituosa.
Portanto, é necessário englobar todas as pessoas e enxergá-las como nossas parceiras de jornada de evolução pessoal, autoconhecimento e mudança. Assim, a postulação de que todos devem ser respeitados está nas raízes do DeRose Method. Este é um preceito muito básico.
Edson Cadette: Em São Paulo, Cadette cresceu ouvindo que o Brasil é um país muito diverso em culturas e histórias. No entanto, foi alimentado durante décadas por uma visão histórica relacionada à Europa. A diversidade não é vista em determinados lugares, e nem era ensinada nas escolas.
A experiência de Cadette é a de não diversidade dentro de um país diverso. Em razão da falta de conversa sobre a diversidade, suas atitudes e pensamentos são até hoje orientados por uma visão europeia e anglo.
Felizmente, a nova geração não aceita mais isso. Essa mudança é fantástica e veio para ficar, mas enfrenta barreiras. O choque com a defesa do status quo é natural, mas diversidade é importante porque temos que ouvir outras vozes.
Letícia Santana: Além de eurocentrada, a sociedade é cis, heteronormativa e sem deficiência. O que é diferente desses parâmetros é tido como anormal. Portanto, é o momento de transformar o mundo com o protagonismo dos grupos minorizados.
Santana declarou ter transformado seu protagonismo de mulher cis, lésbica e com deficiência em propósito de trabalho, atuando como consultora estratégica de diversidade e inclusão para corporações.
Afirma que o movimento para a inclusão de diversidade nas companhias é muito forte, por vezes de forma genuína, por vezes apenas como uma resposta à pressão social. Independentemente disso, as pessoas que trabalham na linha de frente da diversidade estão fazendo um trabalho incrível para que as empresas encontrem esse caminho de forma genuína, e percebam o quanto isso impacta positivamente os negócios.
Para exemplificar, menciona que uma pesquisa da McKinsey apurou que as pessoas homossexuais que não falam sobre a sua sexualidade no ambiente de trabalho gastam 30% de energia tentando disfarçar isso. Elas não têm 100% de performance, somente 70%.
Conclui que cada indivíduo é um ser integral, que não pode ser fragmentado, e que possui múltiplas facetas a serem consideradas. Santana destacou que o acolhimento que recebeu de sua família foi fundamental para o seu desenvolvimento, e que todas as pessoas devem poder ser quem são, inclusive no ambiente de trabalho.
Karina Pimenta: Quais ações um indivíduo que não faz parte dos grupos minorizados pode ter para incluir a diversidade em sua vida?
Fernanda Neis: A palavra que vem à mente é recondicionar. Tem que ser normal. Todo mundo tem que ser respeitado, as características das pessoas têm que ser respeitadas.
Para economizar energia, o cérebro automatiza condicionamentos e reações. Alguns comportamentos devem ser repensados, questionados e recriados. As ferramentas do DeRose Method podem reprogramar os condicionamentos por versões mais atuais, conscientes e inclusivas.
Como exemplo dessas ferramentas, Neis se reporta às pesquisas de Sara Lazar, sobre os impactos da meditação na neuroplasticidade, e as técnicas de reprogramação emocional.
Recondicionando a si próprios e aos alunos, os empreendedores podem ir gerando as ondas de choque, que atingem a família, os amigos, e até as pessoas mais distantes.
Edson Cadette: As pessoas mais influentes devem aprender a escutar, e não abafar a outra história.
Quando Cadette foi morar em Nova York percebeu a diversidade que ele não via nos jornais e revistas do Brasil. Tinha uma visão altamente eurocêntrica de Nova York. No Brasil não havia espaço para outras vozes. Não escutamos outras vozes. É sempre a mesma voz, a mesma história. Na redação do jornal Estadão, não havia nenhum negro em mais de trezentos jornalistas. Mas a influência do jornal é enorme, é lido todos os dias. Onde está a diversidade? Quais as outras vozes? Não existem.
Não escutar a voz do outro é o pecado magistral no Brasil.
E existe uma resistência contra a diversidade. Como a pressão está alta, se escuta “lá vem o mi-mi-mi”. O que a pessoa está dizendo é que não quer escutar a história do outro. Ela quer barrar a história do outro e afirmar a sua própria história como aquela que devemos seguir. O país como um todo perde com isso.
Karina Pimenta: Complementa salientando a importância de que os empreendedores pensem em como podem abrir espaço em suas empresas para que a diversidade aconteça.
Letícia Santana: Dois pontos são relevantes.
O primeiro, complementar ao local de fala abordado pelo Edson, é entender os lugares de privilégio. As pessoas têm medo de falar sobre privilégio, mas ser privilegiado não é um problema. Todos temos nossos lugares de privilégio e opressão. A questão é: o que estamos fazendo com nossos privilégios? Como devolvemos isso para a sociedade?
Santana exemplifica que é uma mulher lésbica e com deficiência, mas é branca. Como ela tenta diminuir essa distância entre ela e as outras pessoas?
É importante a consciência individual de quem somos, dos nossos privilégios e de como podemos contribuir e abrir espaço para outras pessoas.
O segundo ponto é a linguagem. Para não sermos discriminatórios ou preconceituosos, não podemos ter uma linguagem racista, machista, LGBTfóbica ou capacitista. Essa reflexão abrange os ambientes que frequentamos e o nosso comportamento diante do preconceito e discriminação. Essa mudança comportamental deve ser diária.
Karina Pimenta: Letícia, enquanto consultora empresarial, quais as dicas para que empreendedores e empresas tragam inclusão efetiva?
Letícia Santana: O primeiro pilar é trabalhar os vieses inconscientes e começar a se entender como pessoa. Isso ocorre dentro de grandes e pequenas corporações, porque as empresas são feitas por pessoas.
Começar um trabalho para inclusão de diversidade é primeiro trabalhar o indivíduo. É importante que isso ocorra de forma top-down, ou seja, vindo de uma grande líder, ou um grande líder, para que todos entendam que isso vai ser um novo processo de cultura dentro daquela companhia.
Em segundo lugar, como está sendo o recrutamento, avaliação e seleção de pessoas, fornecedores, etc? Ele leva em consideração somente alta-performance, formação superior ou fluência? Se sim, há um grande corte. Não apenas pensando em diversidade, mas um corte social.
Apenas 10% do que aprendemos no setor acadêmico aplicamos nas companhias. 90% é o que fazemos diariamente, e todas as pessoas têm potencial para aprender, se desenvolver e ter alta performance.
Para avaliar, selecionar e recrutar pessoas, é necessário estar livre de julgamentos em relação à localização onde a pessoa mora, onde estudou, o que a família faz, se os pais estão separados. Se há essa preocupação, é porque existe a vontade de contratar pessoas com o perfil semelhante ao daquele que contrata. Aí não haverá diversidade e riqueza da equipe.
Pensando em produtos e serviços, quando mais rica em diversidade a equipe, mais próxima da sociedade a empresa estará, em termos de representatividade. Como exemplo, imaginemos uma empresa que produz shampoo para cabelos. Se existem cinco pessoas na equipe, todas com o cabelo como o de Santana, liso, comprido e escuro, que tipo de shampoo será produzido? Por outro lado, se na equipe há quem use tranças, há quem seja careca, quem tenha os cabelos grisalhos, crespos, cacheados e lisos ou com química, a empresa terá um produto muito mais abrangente.
Em terceiro lugar, como está sendo tratada a pessoa que foi contratada? Se for uma pessoa com deficiência, por exemplo, é importante treinar o inconsciente para não utilizar o comportamento capacitista.
Como exemplo de linguagens capacitistas, Santana se refere a expressões como “não sei se termos braço para isso” ou “ainda está de pé”. Essas expressões sugerem que a ausência desses membros inviabilizaria o acontecimento de projetos, eventos, etc.
A linguagem é muito importante. São pequenas coisas que precisamos treinar, entendendo nossos locais de fala, o que estamos falando e treinando os vieses inconscientes e a liderança inclusiva.
O último pilar é começar a expressar externamente que a empresa é referência em relação à diversidade. LGBT Friendly, com todas as vagas para pessoas com deficiência, com mulheres e homens na mesma faixa salarial, etc.
Todos esses pilares devem acontecer ao mesmo tempo e como um processo, como jornada. Não deve acontecer de forma combativa, e sim com compreensão de que cada pessoa está num nível de consciência. Todos estamos aprendendo juntos e buscando essa transformação.
Neste evento, ainda, Letícia Santana falou sobre os maiores erros em discursos e iniciativas das empresas, e Edson Cadette sobre os movimentos raciais black lives matters e vidas negras importam, e a importância das mídias sociais. Por fim, todos os participantes teceram suas considerações finais.
Para ter acesso ao conteúdo integral, acesse https://www.youtube.com/watch?v=gMThtfIRhRI.
Texto por Luísa Ruas Oliveira
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